O Projeto de Lei Complementar (PLP nº 108/2024), segundo a regulamentar a reforma tributária (EC nº 132/2023), traz uma previsão bastante controversa sobre o ITCMD: a incidência desse imposto sobre a distribuição desproporcional de dividendos, tratando-a como se fosse uma doação, desde que realizada “por liberalidade” e “sem justificativa negocial comprovável”.
ILEGAL E INCONSTITUCIONAL:
- É ilegal: tributar pelo ITCMD a distribuição desproporcional de dividendos como se doação fosse. Implica em violação do artigo 110 do CTN, uma vez que a lei tributária estaria alterando a definição do instituto de direito privado “doação”, utilizado expressamente na Constituição para definir uma das competências tributárias outorgadas aos estados e Distrito Federal.
- É inconstitucional: a cobrança do ITCMD sobre a distribuição desproporcional de lucros, viola a repartição de competências tributárias e, consequentemente, o pacto federativo.
- Invasão de competências: A distribuição de dividendos pela sociedade importa em auferimento de renda pelos sócios, tendo em vista o acréscimo patrimonial dela resultante. Atualmente, os dividendos são isentos do imposto de renda pela União. A tributação deles por meio do ITCMD acarreta uma invasão da competência tributária conferida pela Constituição à União para tributar a renda e proventos de qualquer natureza.
A distribuição desproporcional de dividendos, desde que prevista no contrato social e aprovada em reunião, constitui um negócio jurídico entre os sócios e a sociedade, sendo uma decisão de caráter societário. Não se trata de um acordo civil onde a sociedade atua como doadora e os sócios como beneficiários. A sociedade não compromete seu patrimônio em benefício dos sócios.
Não há liberalidade. A distribuição de dividendos é uma maneira de remunerar os sócios pelo capital que investiram na sociedade. Antes de receberem os lucros, os sócios aplicaram recursos para a criação e o crescimento da atividade econômica da empresa.
Apesar das frequentes justificativas negociais, o artigo 1.007 do Código Civil, que sustenta a distribuição desproporcional de lucros, não exige a comprovação de um propósito negocial para tal prática. A cláusula inicial do dispositivo (“Salvo estipulação em contrário”) destaca a predominância da autonomia privada na determinação da forma de distribuição de dividendos desproporcionais. Como mencionado, trata-se de uma decisão dos sócios e da própria sociedade.
Por fim, a sociedade distribui apenas os lucros que gera, sem comprometer seu patrimônio. Existe uma clara distinção entre lucro, que é dinâmico, e patrimônio, que é estático. A sociedade não reduz seu patrimônio para beneficiar os sócios, mas reparte os lucros provenientes de sua atividade econômica. Isso difere da doação, onde o doador, de forma voluntária, diminui seu patrimônio em favor do beneficiário.